Médicos podem se tornar motoristas de Uber em 10 anos?
De acordo com o especialista em investimentos Raul Sardinha, o cenário para os médicos no Brasil pode não ser tão promissor nos próximos anos. Em um vídeo recente, ele se aprofundou em como a quantidade crescente de médicos pode resultar em saturação e uma possível baixa na renda nesta década.
E a verdade é que os números são impressionantes. Desde 1990, o Brasil passou de cerca de 131 mil médicos para aproximadamente 576 mil atualmente. Isso representa um crescimento de mais de quatro vezes, enquanto a população cresceu apenas 42% no mesmo período — de 144 milhões para cerca de 205 milhões de habitantes.
Atualmente, para cada 1.000 habitantes, temos cerca de 2,81 médicos, uma proporção até maior do que em países como Estados Unidos e Japão. Essa informação realmente levanta questões sobre como o mercado de trabalho para médicos poderá se desenhar no futuro.
Crescimento das faculdades de medicina no Brasil
Raul Sardinha também ressaltou que a quantidade de faculdades de medicina aumentou de forma significativa desde 1990. O número de vagas em universidades públicas, por exemplo, cresceu 64% entre 2003 e 2023, subindo de 19.917 para 32.080. Isso também impactou as instituições privadas, levando a uma ampla oferta de cursos.
“Essas universidades começaram a oferecer o curso de medicina de diferentes formas”, disse Sardinha, o que pode ter afetado a qualidade do ensino. O mercado de cursos de medicina, aliás, movimentou cerca de R$ 21 bilhões em 2022. As mensalidades estão em torno de R$ 8 mil a R$ 12 mil, quase oito vezes mais do que outras graduações. Um negócio bastante lucrativo para as mantenedoras.
Finanças e estratégias de mercado no ensino médico
Sardinha apresentou dados interessantes quando o assunto é o valor das vagas de medicina. Segundo suas análises, cada vaga pode ser avaliada em até R$ 2 milhões. Instituições como Afya Educacional e Ânima Educação possuem milhares de alunos, e a maioria deles vem de famílias com renda significativamente alta.
Ele comparou essa situação com a área de enfermagem, onde apenas 0,11% dos alunos têm um perfil familiar semelhante. Isso mostra uma diferença clara nas oportunidades e na dinâmica do mercado.
Dificuldades enfrentadas pelos novos médicos
A previsão de que o Brasil possa ter até um milhão de médicos até 2035 traz à tona preocupações sobre o mercado de trabalho. Com essa quantidade, a relação de 5,5 médicos por 1.000 habitantes pode diminuir o poder de remuneração. Sardinha destacou que, embora a população esteja envelhecendo, isso não vai ocorrer na mesma velocidade da formação de novos médicos.
Além disso, o Brasil tem cerca de 65 mil estudantes cursando medicina em países vizinhos. Muitos podem retornar ao Brasil, o que pode agravar a já crescente competição por vagas.
Especializações médicas e precarização do trabalho
Sardinha observou que essa inclusão massiva de novos médicos pode impactar mais aqueles que atuam como médicos generalistas. Para se diferenciá-los, especializações em áreas em ascensão, como oftalmologia e procedimentos estéticos, se tornam cada vez mais atraentes. Esses campos têm uma demanda maior e uma oferta menor, o que favorece os profissionais.
Ele também comentou sobre a precarização do trabalho médico, com muitos médicos aceitando contratos sem garantias trabalhistas para conseguir se manter. Isso pode afetar o rendimento real dos profissionais na área.
Planejamento financeiro para médicos no Brasil
No que diz respeito ao planejamento financeiro, a média salarial de um médico no Brasil gira em torno de R$ 14.542 por mês. Sardinha fez uma simulação interessante: se um médico investisse 25% desse valor (cerca de R$ 3.635) ao longo de 10 anos, poderia acumular cerca de R$ 637 mil. E considerando um rendimento de 14% ao ano, esse valor poderia subir para aproximadamente R$ 876 mil.
Além disso, ele explorou outras alternativas de investimento, como investir 50% da renda por 10 anos ou 25% por 20 anos, sugerindo que existe vida financeira fora da carreira médica.
O crescimento acelerado na formação de médicos e a estagnação na demanda por serviços de saúde levantam reflexões sobre o futuro, mas as possibilidades de um bom planejamento financeiro ainda estão ao alcance dos profissionais.