Megaprojeto de US$ 1 trilhão visa solucionar a falta de água nos EUA
Imagine um projeto gigantesco que poderia mudar a cara da América do Norte: a NAWAPA, ou North American Water and Power Alliance, que custaria cerca de um trilhão de dólares e levaria água do Alasca para os desertos do sudoeste dos Estados Unidos e do norte do México. Essa ideia, concebida nos anos 60 por Ralph M. Parsons com a ajuda do Corpo de Engenheiros do Exército dos EUA, visava irrigar áreas que sofrem com a escassez de água.
Na época, os EUA enfrentavam um verdadeiro boom populacional pós-Guerra, com aproximadamente 76 milhões de nascimentos entre 1946 e 1964. Ao mesmo tempo, a produção industrial dobrou, o que fez a necessidade de água disparar. O consumo diário saltou de 180 para 270 bilhões de galões na década de 50, e regiões áridas como Califórnia, Arizona e Nevada estavam sentindo o impacto dessa demanda crescente.
Como funcionaria o projeto
O plano da NAWAPA era audacioso. Vamos aos detalhes:
- Desviar rios como Yukon, Liard e Peace.
- Construir um reservatório impressionante no Rocky Mountain Trench.
- Distribuir essa água por gravidade ou bombeamento para estados como Montana, Utah e até mesmo para o noroeste do México.
- A intenção era também estabilizar os níveis dos Grandes Lagos, desviado água para lá.
- Portanto, seriam necessárias cerca de 369 obras ao longo de 30 anos. Estima-se que seriam utilizados 200 milhões de sacos de cimento, 30 milhões de toneladas de aço e 100 mil toneladas de cobre e alumínio, gerando até 4 milhões de empregos e 3,8 GW de energia, o que daria para abastecer 3 milhões de lares.
Contas complicadas
Nos anos 60, a estimativa de custo era de US$ 100 bilhões, algo próximo a mais de US$ 1 trilhão hoje. Esse número se aproximava do que foi gasto na construção do sistema de rodovias interestaduais. Parsons acreditava que o investimento seria pago em 50 anos, por meio da monetização do uso da água e da energia gerada.
A ideia gerou apoio de políticos de diferentes espectros, como o congressista Jim Wright e o senador Frank Moss, ambos elogiando o potencial do projeto. Até o então primeiro-ministro canadense, Lester Pearson, reconheceu a importância da NAWAPA.
Environmentalismo e soberania em choque
No entanto, à medida que os anos 70 avançavam, a NAWAPA encontrou um grande obstáculo: a crescente preocupação ambiental. Leis, como a NEPA, passaram a exigir estudos detalhados sobre os impactos do projeto. Especialistas alertaram que as barragens poderiam afetar ecossistemas, como a migração de salmões, além de ameaçar comunidades indígenas. O projeto recebeu críticas severas, sendo rotulado como “anticristo hidrológico” por seu potencial de causar danos imensos.
Além disso, faltou uma coordenação adequada entre os países envolvidos e a proteção dos direitos dos povos indígenas.
Renascimento moderno?
Apesar de ter ficado adormecido por décadas, a ideia ganhou nova vida em 2012 com o NAWAPA XXI, promovido por um grupo vinculado a Lyndon LaRouche. Eles ampliaram o escopo do projeto, propondo que ele gerasse até 42 GW de energia e dobrasse a área irrigável no sudoeste dos EUA. Porém, críticos apontam que essa nova proposta também ignora os impactos ambientais.
Comparações globais e limites do modelo
A China já mostrou que mega-projetos hídricos podem ser bem-sucedidos, como demonstrado pelo South-North Water Transfer Project e pela barragem das Três Gargantas, que foram acompanhadas de um controle ambiental mais rigoroso.
Entretanto, o clima mudou. Com secas extremas e chuvas intensas se tornando mais frequentes, as soluções fixas agora parecem arriscadas. Estudos sugerem que esse tipo de projeto, por depender de condições climáticas específicas, se torna ecologicamente vulnerável.
Vale a pena ressuscitar a NAWAPA?
Tecnologia: viável? Sim, as técnicas de barragens e canais já eram dominadas há décadas.
Financeiramente: justificável? Talvez. A arrecadação futura poderia cobrir os custos, mas tudo depende da estabilidade política entre os países envolvidos.
- Ambiental e socialmente: sustentável? Não, a menos que os planos incluam proteções ecológicas e respeito pelos direitos dos povos.
É uma conversa que provoca muitas reflexões sobre como lidamos com recursos hídricos e que tipo de soluções realmente precisamos para o futuro.