Frota fantasma dos EUA: 2.000 navios ancorados em prontidão

Em águas tranquilas de baías e rios dos Estados Unidos, centenas de navios de aço estão ancorados, esperando um chamado que pode nunca acontecer. Estamos falando da famosa frota fantasma dos EUA, uma verdadeira reserva estratégica de embarcações que podem ser reativadas em situações críticas, como uma possível guerra. Sob a administração da MARAD, essa frota também é conhecida como National Defense Reserve Fleet (NDRF), e é um dos segredos que compõem a logística de defesa americana.

Contrariando a ideia de que são navios abandonados, essa frota é uma parte importante da estratégia militar. Criada após a Segunda Guerra Mundial, ela já desempenhou papéis essenciais em conflitos como a Guerra da Coreia e a Guerra do Vietnã. Hoje, num tempo de tensões globais crescentes, a frota fantasma passa por um processo bilionário de modernização, transformando o que era um legado enferrujado em um ativo estratégico vital para o futuro.

A origem após a Segunda Guerra e a Lei de Venda de Navios Mercantes de 1946

A história da frota fantasma remonta ao final da Segunda Guerra Mundial. Com os EUA emergindo como a potência com a maior frota de navios mercantes do mundo, era necessário encontrar uma solução para gerenciar essa excedente. A resposta veio com a Lei de Venda de Navios Mercantes de 1946, que permitiu a venda de embarcações para operadores comerciais e, ao mesmo tempo, autorizou a criação de uma reserva para a defesa nacional.

Essa reserva, a NDRF, cresceu rapidamente. Em 1950, no auge, contou com impressionantes 2.277 navios ancorados em oito locais ao longo da costa americana. As fileiras dos icônicos navios Liberty e Victory tornaram-se um símbolo silencioso do poderio industrial americano durante a Guerra Fria.

Do que é composta a frota fantasma? A diferença entre a NDRF e a RRF

É comum pensar que a frota fantasma é uma armada de combate à espera. Na verdade, a maioria dos navios que compõem a NDRF são de tipo mercante. Isso inclui cargueiros, navios-tanque e os famosos navios Ro-Ro (Roll-on/Roll-off), que são fundamentais para transportar veículos militares.

O verdadeiro diferencial da frota está na Ready Reserve Force (RRF). Este é um grupo de cerca de 51 navios mantidos em excelentes condições, prontos para ser ativados em um prazo de 4 a 20 dias. Eles são a espinha dorsal da frota, prontos para responder rapidamente a qualquer necessidade.

Os “cemitérios” de navios, os três ancoradouros da frota

Inicialmente, a frota tinha oito ancoradouros, mas em 2025 apenas três continuam operacionais:

James River Reserve Fleet (Virgínia): o mais antigo, com origem que remonta ao final da Primeira Guerra Mundial.

Beaumont Reserve Fleet (Texas): o único remanescente na Costa do Golfo, que hoje é um centro crucial para os navios da RRF.

Suisun Bay Reserve Fleet (Califórnia): conhecida por sua imagem icônica, com mais de 340 navios em seus dias de glória. Após um esforço de limpeza ambiental, essa frota é agora uma sombra do que já foi, mas ainda é lembrada como o maior cemitério de navios da América.

Um histórico de reativações, da Guerra da Coreia à Operação Liberdade do Iraque

A NDRF provou sua importância várias vezes ao longo da história. Durante a Guerra da Coreia, por exemplo, 540 navios foram reativados para transportar tropas e suprimentos. A frota esteve presente em momentos-chave, como na crise do Canal de Suez em 1956, e na Guerra do Vietnã, onde 172 navios foram colocados em serviço.

Mesmo após a Guerra Fria, sua utilidade continuou. Em 2003, seis navios do ancoradouro de James River foram usados para transportar equipamentos para a Operação Liberdade do Iraque, reafirmando a relevância da frota como uma ferramenta vital no século XXI para a projeção de poder militar.

Modernização e a Lei SHIPS for America

A frota fantasma atual é bem diferente da de 1950. Em 28 de fevereiro de 2025, somente 87 embarcações estavam no inventário da MARAD. O foco agora é na qualidade e na prontidão, não mais na quantidade.

Compreendendo as vulnerabilidades da logística, o governo dos EUA está discutindo a Lei “SHIPS for America”. Essa proposta pretende ser a reforma mais significativa da política marítima em décadas, com o objetivo de revitalizar toda a indústria naval do país. O plano é muito mais do que apenas renovar navios. Trata-se de reconstruir a capacidade de projeção de poder marítimo dos EUA, garantindo estaleiros, marinheiros qualificados e uma cadeia de suprimentos robusta.

Assim, a frota fantasma do futuro não será medida apenas pela quantidade de navios, mas pela capacidade do país de exercer sua força nos mares. A verdadeira força de uma marinha, no fim das contas, não está só nos navios de combate, mas também na infraestrutura que garante que a luta possa continuar, caso seja necessário.