Estudo confirma que a primeira pandemia da história aconteceu há 1.500 anos

Pesquisadores identificaram a bactéria que causou a Peste de Justiniano, apontada como o primeiro surto global registrado pela humanidade.

Ao longo da história, grandes surtos de doenças transformaram civilizações inteiras, deixando marcas não apenas na saúde, mas também na política, na economia e na cultura. Apesar disso, apontar com certeza qual foi a primeira pandemia registrada sempre foi um desafio, já que os relatos antigos muitas vezes são vagos ou fragmentados.

Agora, novas evidências científicas ajudam a resolver esse mistério histórico. Pesquisadores confirmaram que a Peste de Justiniano, que começou no século 6, foi de fato a primeira pandemia oficialmente documentada.

O surto devastou o Império Bizantino e várias regiões do Mediterrâneo Oriental entre os anos de 541 e 750 d.C. Durante esse período, calcula-se que 30 a 50 milhões de pessoas tenham morrido — uma parcela significativa da população daquela época.

O que os cientistas descobriram

O estudo mais recente encontrou DNA da bactéria Yersinia pestis, causadora da peste bubônica, em restos humanos de Jerash, na Jordânia. Esse local fica a cerca de 320 quilômetros do Egito, exatamente onde antigos relatos situavam o início da epidemia.

A análise mostrou que os dentes de oito vítimas continham cepas quase idênticas da bactéria, um forte indício de que houve uma circulação rápida e letal. Para os pesquisadores, essa é a prova biológica que faltava para explicar os registros históricos sobre a Peste de Justiniano.

Segundo os cientistas, esse achado não apenas confirma a origem da pandemia, mas também mostra como antigas cidades tiveram que se adaptar de repente a crises de saúde pública. No caso de Jerash, por exemplo, um espaço que antes servia para lazer e convivência foi transformado em cemitério coletivo durante a emergência.

Impacto no Império Bizantino

A peste chegou até a capital, Constantinopla. Estima-se que dezenas de milhares de pessoas tenham morrido em apenas quatro meses. O próprio imperador Justiniano I adoeceu, mas conseguiu se recuperar.

Ainda assim, os efeitos foram devastadores. Muitos historiadores acreditam que a pandemia contribuiu para o enfraquecimento econômico e político do império, deixando-o vulnerável a guerras e invasões nos séculos seguintes.

Comparações com outras pandemias

Até pouco tempo, os cientistas já haviam identificado a Y. pestis em sítios da Europa Ocidental, mas não no coração do Império Bizantino. Essa lacuna mantinha dúvidas sobre a real causa da epidemia.

A pesquisa atual analisou centenas de genomas antigos e modernos da bactéria e concluiu que os surtos de peste não vieram de uma única linhagem. Eles surgiram várias vezes, de diferentes regiões e de reservatórios animais, reaparecendo em épocas distintas.

Esse padrão é diferente, por exemplo, da Covid-19, que se espalhou mundialmente a partir de um único evento de contaminação entre humanos. Já a peste voltou diversas vezes, com linhagens diferentes, atingindo populações em ondas sucessivas.

A peste ainda existe

Embora rara hoje em dia, a peste bubônica não desapareceu totalmente. Em julho de 2025, um homem no Arizona, nos Estados Unidos, morreu de peste pneumônica — a forma mais grave da doença. Pouco depois, outro caso foi registrado na Califórnia.

Como explicam os pesquisadores, a peste ainda circula em algumas regiões e pode se manifestar de tempos em tempos. Assim como a Covid, o patógeno continua a evoluir, mantendo-se uma ameaça, mesmo que em menor escala.

Próximos passos na pesquisa

A equipe de especialistas agora pretende ampliar o estudo para a Itália, especialmente no Lazaretto Vecchio, em Veneza, onde está um dos maiores cemitérios de vítimas da peste no mundo. Mais de 1.200 amostras humanas coletadas nesse local devem ajudar a entender como a doença evoluiu ao longo do tempo e como as sociedades antigas criaram suas primeiras medidas de saúde pública.

Mais do que resolver um mistério de 1.500 anos, essa descoberta reforça um ponto importante: pandemias não são fenômenos isolados do passado, mas parte recorrente da experiência humana.