Ana Maria Gonçalves é a primeira mulher negra na ABL
A Academia Brasileira de Letras (ABL) fez história ao eleger, pela primeira vez, uma mulher negra para uma de suas 40 cadeiras. Ana Maria Gonçalves, autora do aclamado romance “Um Defeito de Cor”, foi escolhida na tarde de quinta-feira para ocupar a vaga que pertencia ao linguista Evanildo Bechara, falecido em maio.
Ana Maria, de 54 anos e natural de Minas Gerais, inscreveu-se para a cadeira número 33 logo após uma sessão em homenagem a Bechara. Desde o início, ela foi vista como uma forte candidata, recebendo 30 votos. Sua concorrente, a escritora indígena Eliane Potiguara, obteve apenas um voto. No total, 12 candidatos disputaram a vaga, entre eles nomes como Ruy Lobo, Denilson Marques da Silva e Gilmar Cardoso.
Durante uma recepção em sua editora, Ana Maria comentou sobre sua eleição, que considera um sinal de que a ABL está mais aberta à diversidade brasileira. Para ela, essa mudança pode refletir um compromisso da Academia em abordar a língua portuguesa de forma mais inclusiva, valorizando as contribuições culturais de africanos e indígenas.
Gonçalves ressaltou que sua candidatura surgiu da vontade de representar um público que se sente ausente na literatura da ABL. Ela deseja contribuir para a inclusão de novas vozes e tecnologias literárias, como a oralidade, que são parte fundamental da cultura brasileira.
Seu livro “Um Defeito de Cor”, lançado em 2006, é considerado um divisor de águas na literatura negra brasileira. A obra narra a vida da personagem Kehinde, que passa por experiências dolorosas desde seu sequestro na África até a busca por seu filho no Brasil. O livro já vendia 180 mil cópias e teve impacto em diversas áreas, inclusive na cultura popular.
Críticos literários, como Fernanda Miranda, destacam a importância de Gonçalves na literatura brasileira, especialmente por promover a presença de autoras negras em um gênero historicamente dominado. Miranda observa que a obra amplifica a compreensão sobre a complexidade da África e reflete a diversidade cultural do Brasil.
A eleição de Ana Maria Gonçalves representa um avanço, segundo especialistas, rumo a uma ABL que reconhece a dinâmica e a diversidade da literatura nacional. Em contraste, a eleição de Conceição Evaristo em 2018 foi marcada por controvérsias, onde ela obteve apenas um voto. A ABL foi vista como lenta para reconhecer novos talentos e abrir espaço para vozes diversas.
Nos últimos anos, a Academia têm se mostrado mais receptiva, ao eleger, por exemplo, Ailton Krenak, o primeiro indígena a integrar suas fileiras. Entretanto, ainda é necessário mais trabalho para representar a pluralidade da sociedade brasileira, já que a maioria dos acadêmicos é composta por homens brancos.
Especialistas afirmam que a recente eleição pode reabrir o debate sobre a falta de representatividade nas instituições brasileiras. A presença de figuras como Ana Maria e Ailton Krenak é vista como uma oportunidade para redefinir padrões e refletir sobre os mecanismos de exclusão que historicamente marcaram o cenário literário do país.
O momento é considerado importante para a literatura brasileira e para a ABL, que agora enfrenta o desafio de manter essa nova direção e promover um ambiente ainda mais inclusivo. Assim, a eleição de Ana Maria pode não apenas ser um marco, mas também um passo em direção a uma ABL que se aproxime mais da realidade cultural do Brasil.