“Era um vício. Dava vontade de ficar mexendo o tempo todo.” Essa é a definição da estudante Priscila Henriques Lopes da Silva, de 14 anos, sobre seu antigo relacionamento com o celular. Sua amiga, Sophia Magalhaes de Lima, também com 14 anos, concorda, mas nota uma mudança: “Hoje em dia não dá tanta vontade. A gente percebe que não precisa ficar mexendo no celular para se divertir”. Essa nova perspectiva é fruto de uma medida da prefeitura do Rio de Janeiro, que proibiu o uso de celular nas escolas a partir do início do ano letivo de 2024.
Essa decisão antecipou o que se tornaria uma regra nacional, conforme uma nova lei federal. O estudante Enzo Sabino Silva Cascardo, de 15 anos, relembra que, antes da proibição, as aulas eram frequentemente interrompidas por distrações com jogos e redes sociais. “Ninguém prestava atenção”, conta ele. Os professores também se sentiam frustrados, perdendo tempo precioso para tentar chamar a atenção da turma. E mesmo nos recreios, a cena era a mesma: “Era como nos desenhos animados, todo mundo com a cabeça baixa, focado no celular, sem dar atenção uns aos outros”.
No início, a proibição gerou descontentamento entre os alunos, como brinca Enzo: “Ficamos chateados, para não usar outra palavra”. No entanto, logo a dinâmica nas escolas se transformou. O recreio voltou a ser um espaço de brincadeiras e conversas, e dentro da sala de aula, os professores passaram a lidar com mais conversas paralelas e menos distrações digitais.
De acordo com a prefeitura, os resultados dessa mudança são visíveis e também medíveis. Dados recentes revelam um aumento de 25,7% no desempenho dos alunos em matemática e 13,5% em português durante 2024. Um pesquisador da Universidade de Stanford analisou esses números, isolando outros fatores e comprovando que a proibição do celular realmente trouxe ganhos significativos.
Para o secretário municipal de Educação, Renan Ferreirinha, os estudantes aprenderam até um bimestre a mais em matemática dentro do mesmo período. Ele ressalta que o impacto foi crescente, mostrando melhorias mês a mês.
A aluna Tauana Vitória Vidal Fonseca, também de 15 anos, faz parte desse avanço. Ela relata que, com a proibição, seus resultados melhoraram muito. “Antes eu não prestava atenção nas aulas, agora minha nota subiu bastante!”, comemora. Os alunos do Ginásio Educacional Olímpico (GEO) Reverendo Martin Luther King, onde estudam, vivenciaram essas mudanças de perto.
A diretora Joana Posidônio Rosa compartilha que enfrentou resistência inicialmente. “Alguns alunos brigavam e se recusavam a aceitar a mudança”. Mas um fator ajudou: a comunicação ativa com as famílias. “Começamos a dialogar pelos grupos de WhatsApp e nas reuniões. A adesão foi praticamente 100%”. Muitos pais relataram dificuldades semelhantes em casa, com os filhos grudados nos aparelhos.
Segundo o professor de história Aluísio Barreto da Silva, reações extremas, como gritos e choros, foram comuns quando os alunos tinham seus celulares apreendidos. Ele mencionou que isso pode ser um reflexo do tempo em que as aulas foram totalmente remotas durante a pandemia, aumentando a dependência da tecnologia.
Com o tempo, a situação começou a melhorar rapidamente. Em semanas, ele percebeu que os alunos estavam mais atentos e participativos. A primeira estratégia foi criar uma caixa para guardar os celulares ao início das aulas, que após um tempo, foi substituída por uma única caixa na direção, pois muitos alunos já optavam por não levar os aparelhos.
Além das aulas regulares, o GEO oferece treinamentos esportivos. Mesmo durante os treinos, que costumam ser momentos animados, a presença de celulares era uma distração. Com a mesma proibição, o ambiente ficou ainda mais propício para a socialização e a interação.
Sophia trocou o celular por novas atividades e se destacou no xadrez, conquistando o título de campeã estadual. Ela notou que melhorou sua concentração após a proibição. Ana Julia da Silva, de 14 anos, também relatou mudanças no seu comportamento. “Eu fazia muita bagunça e estava sempre mandada para a direção. Agora, entendo melhor meus atos”, afirma.
O secretário Renan Ferreirinha complementa que a escola não é apenas um lugar de aprendizagem, mas também de socialização. Ele percebe que a nova medida contribuiu para um ambiente mais acolhedor, diminuindo casos de bullying e cyberbullying.
Para Ferreirinha, essa experiência mostra como decisões públicas podem ajudar famílias a enfrentarem os desafios da tecnologia. Ele acredita que a discussão sobre o uso de redes sociais por crianças e adolescentes é essencial e sugere que a idade mínima para acesso seja elevada para 16 anos, apontando para a necessidade de um “freio de arrumação” nessa era digital.